quinta-feira, fevereiro 15, 2007

Ambiguidade

Não tenho saudades de casa, tenho saudades de ser, aí, onde o familiar me descansava. Tenho saudades da segurança de vos ter por perto. As saudades crescem alimentadas pelo confronto constante com o que é diferente e me causa estranheza. Sinto-as a arder na pele como feridas abertas de ter arrancado, com força e pressa a mais, as raízes que me prendiam os braços e as pernas ao que aí era meu. Doi-me a amputação, dor fantasma de partes de mim que já não tenho. Aqui, sinto-me intranquilo, a novidade traz-me o desassossego. Desenham-se dentro de mim imagens ambíguas e desarmoniosas, a projecção simultânea do mesmo objecto com lentes diferentes: a do desconforto e a do deslumbramento. Se, por um lado, me falta o que é habitual, por outro, arrebata-me e enche-me os sentidos o que é diferente. Como o mar gelado de Helsínquia...


A partilha é sempre terapêutica para mim...

4 comentários:

fee disse...

Não fazes ideia das emoções que me fizeste sentir! Fez no dia 6 de Fev. um ano que escrevi o mesmo que tu, com essa sensação de deslumbramento, mas também de medo pelo desconhecido.É impressionante como se estabelecem tantos paralelismos quando as experiências são semelhantes.
Um beijo bem grande e obrigada por me fazeres relembrar:)
P.S tive de ir ler todos os meus posts desde o início do blog para encontrar este, que transmite o que estás a sentir, o que eu senti:
http://devaneiosnojardim.blogspot.com/2006/02/um-momento-para-pensar.html

Anónimo disse...

Ai amigo, fizeste com que o meu peito se apertasse de tantas saudades...
Aqui no mesmo lugar de sempre, paira a saudade sem o deslumbramento... na ansiosa espera pelo regresso tão esperado.
Mas daqui a alguns dias vou matá-las... e deslumbrar-me também!
Bjinhos grandes para ti e para o companheiro de viagem!

racker disse...

Abri o teu blog e estava a ouvir Cover Sleeve dos Coldfinger (não sei se conheces)... mas se conheceres deves imaginar o ambiente que cria. Se para ti partilhar é terapêutico, para quem lê é mais do que isso!

É sentir que, apesar de esteres tão longe, continuas a dar o devido valor ao que cá deixaste! É perceber que, apesar de teres mudado muito, no teu âmago continuas a mesma pessoa. É repensar toda a minha vida e o modo como a influenciaste - e continuas a influenciar com estes teus textos que provocam pequenos arrepios de contentamento!

As feridas podem doer, mas quando saram acabam por nos deixar mais fortes, mais resistentes em relação à mudança! Nem tudo é mau...

catavento disse...

1.
alguém disse que "Crescer implica sempre deixar algo para trás." implica tantas vezes deixar o familiar e essa segurança da rotina e do habitual.

2.
preciso da independencia brutal que chega com esse corte e com essa partida. estou só mas sou livre.

3.
reconheço a ignorância todos os dias. reconheço a beleza com que me deslumbro. há um turbilhão de ideias e sentimentos cá dentro a girar a girar a girar ou não fosse um catavento que espera um vento mais forte para voar.

4.
não encontro ambiguidade apenas uma dualidade que se completa.

5.
o desconforto aquece-me o coração nas horas mortas em que conto os dias para o regresso a casa.

6.
às vezes penso que é a distancia que me aumenta o encanto da novidade.
às vezes penso em tanta coisa e é a saudade que me enche por me faltar qualquer coisa que apenas a beleza e a magia de um sitio não preenchem.

*